Retorno a Vogler
Pouco mais de um ano após ter partido de casa Martin Greenshield faz o caminho de volta a Vogler com seu inicialmente mentor, e agora amigo, Astray Verda. É o 11⁰ dia do mês de Darkember do ano de 349 DC (Depois do Cataclisma), na Solamnia. O outono está em seu ápice e a lua de Solinari estará cheia no dia seguinte. É nessa época que também ocorre o Festival do Rei Pescador, a mais importante festa de Vogler. Nela os habitantes de Vogler, ainda que tenham esquecido das minúcias e razões dos antigos rituais, prestam homenagem a Habbakuk, um dos filhos de Paladine e Mishakal, e deus da perseverança, patrono da caça e da pesca, e protetor de homens e animais e do ciclo da vida. Habbakuk tem no Kingfisher, o pequeno e delicado pássaro de penugem azul como o céu, seu principal símbolo, disso sabe bem Astray Verda, que no passado foi um jovem monge, mas que hoje prefere guardar as coisas para si. Agora, no caminho de volta para Vogler, ele e seu pupilo se ocupam das vicissitudes da estrada.

Diferente da sua última visita a Vogler, quando conheceu Martin Greenshield – o filho bastardo que ele não conhecia de seu antigo companheiro de aventuras Ispin Greenshield – eles não tomam o caminho da balsa. Dessa vez, eles veem pelo oeste, pela estrada que leva até o Portal do Rio, a entrada noroeste de Vogler através da península de Hinterlund ao norte do Rio Vingaard. O motivo da escolha desse caminho não é trivial. Nesse último ano Astray e Martin se dedicaram a buscar pistas sobre o paradeiro de Kansaldi e Lohezet, em busca de justiça por aquela noite fatídica. As raras notícias de aparições de figuras similares aos seus alvos quase sempre se misturavam com relatos inusitados de grupos de soldados se movimentando na região. Estaria Kansaldi junto com um grupo de mercenários? Eles não sabiam dizer. O certo é que suas buscas os levaram a se unir ao Ironclad Regiment.

O Ironclad Regiment era uma tropa de mercenários muito bem organizada e de boa reputação que costumava atuar na região. Mas o mais importante sobre a tropa era que sua comandante, Ridomir “Cudgel” Ironsmile, era uma antiga companheira de aventuras tanto de Astray quanto de Ispin Greenshield, e conhecera Martin ainda criança. Cudgel os recebeu no Ironclad Regiment como irmãos, e durante algum tempo eles atuaram com o grupo. Mas após diversos meses, novos boatos sobre misteriosas tropas se movimentando em outros lugares os levaram a se separar do Regimento. Quando eles se separaram, ainda, um dos membros do Ironclad Regiment decidiu os acompanhar: Drake Mordek era um competente batedor que nascera e tinha família em Vogler e isso o levou a estreitar laços com Astray e Martin. A amizade e a oportunidade de voltar a sua cidade natal para o Festival do Rei Pescador trouxera também Mordek, juntamente com Astray e Martin, para aquela estrada tortuosa que conduziria até o Portal do Rio em Vogler. E foi ali que os deuses e o destino quiseram que, uma vez mais, o chamado da aventura os alcançasse na forma de um camponês de nome Rhys que, desesperadamente, buscava por ajuda.
Emboscada na Estrada
O jovem Rhys, ferido e ofegante, surpreende Astray, Martin e Mordek na estrada saindo do meio do bosque que a circunda. Ele conta que havia sido contratado por um grupo de guerreiros forasteiros para guiá-los até Vogler, onde o comandante deles precisava entregar uma carta. Ele também fora solicitado a encontrar um ferreiro para reparar as ferraduras dos cavalos deles que, sem os quais, não poderiam avançar mais. Rhys teria avançado até Vogler e trazido o jovem ferreiro de lá. Porém, ao chegarem até o acampamento dos guerreiros, foram surpreendidos ao encontrá-lo destruído. Os guerreiros, alguns mortos, outros feridos, haviam sido atacados e dominados por outro grupo de guerreiros, aparentemente bandidos. Mas esses bandidos não estavam sozinhos. Eles eram acompanhados de estranhas criaturas com asas e garras que Rhys jamais havia visto, nem em seus piores pesadelos. Os bandidos perceberam Rhys e o ferreiro e os subjugaram. Mas graças a uma distração criada pelo ferreiro – que, por sua bravura, havia sido nocauteado pelo líder dos bandidos – Rhys conseguira escapar e fugira em busca de ajuda; porém, tinha certeza que estava sendo perseguido pelas criaturas.

Ao ouvir o apelo desesperado, Astray e Martin não pensaram duas vezes. Pessoas estavam em perigo e, além do mais, eles tinham certeza que o ferreiro, pela sua coragem, não poderia ser outro que não o jovem amigo de Martin, Ryushi de Neraka. Enquanto Martin e Rhys se embrenharam pela orla direita da estrada, em meio às árvores cerradas do bosque, Astray tomou o caminho da esquerda, com Mordek avançando furtivamente à sua frente. Ao se aproximarem viram a cena descrita por Rhys: os bandidos, porém, pareciam mais parte de um regimento de soldados bem treinados. Havia ao todo quatro deles, todos humanos, e um deles, que parecia o comandante, olhava inquisitivo o entorno como que em busca de algo. No chão, em meio às carroças destruídas e os cavalos mortos que bloqueavam a estrada, além dos corpos dos guerreiros guiados por Rhys, dois sobreviventes estavam ajoelhados e feridos, vigiados por um dos soldados agressores: um deles era claramente Ryushi, Martin identificou. Do outro lado, Astray, por sua vez, surpreendeu-se ao identificar o brasão nas armaduras do grupo que havia sido guiado por Rhys: eram Cavaleiros da Solamnia.
Astray e Martin tinham ainda a vantagem da surpresa. Ainda, pois, antes que Astray pudesse tentar fazer algo, diante dele, Mordek surgiu tropeçando em um galho e chamando a atenção de um dos soldados agressores que estava bem diante dele. A ação desastrada de Mordek precipitou o combate.
De um lado, Astray e Mordek se engajaram com soldados, e Martin de outro. O ataque precipitou a ação do soldado que estava com a lâmina no pescoço de Ryushi que seria executado, não fosse pela brava ação do Cavaleiro da Solamnia ferido que estava ao seu lado, o comandante do grupo, que ele sabia já se chamar Markam Vendri. Sir Vendri, corajosamente, puxou a perna do soldado antes que ele passasse a lâmina pelo pescoço de Ryushi salvando-o. Porém, isso teve o custo de sua própria vida: o soldado agressor, furioso com Sir Vendri, trespassou inclementemente, com sua espada curta, através do ombro esquerdo do mesmo, o coração do Cavaleiro da Solamnia que imediatamente tombou pesadamente no solo. Sua mão sem vida ainda segurava firmemente sua herança de família, um Amuleto do Rei Pescador. O sacrifício de Markam Vendri despertou a ira de Ryushi que aproveitou o momento para reagir e com um bastão de metal que tinha em suas mãos, carregado agora por energias arcanas que ele invocara em sua fúria, atacou ruidosamente o soldado agressor que há poucos instantes quase tirara sua vida.
O combate se desenrolava de forma mais ou menos equilibrada, com Martin Greenshield, particularmente, levando dor e desespero aos seus inimigos; até que do meio das árvores, estranhas criaturas surgiram e atacaram especificamente Martin. Eram seres de fato, como dissera Rhys, saídos de pesadelos. Nem mesmo o experiente Astray jamais vira criaturas como aquelas. Além de asas e garras, os seres, apesar de tamanho e formas humanoides, tinham presas e escamas. Eram quase como uma mistura profana de homens e dragões. Parecia haver dois tipos diferentes desses seres. Os mais robustos tinham escamas esverdeadas, os mais esguios, escamas avermelhadas. Ambos usavam, para coroar a estranheza daquilo tudo, armas e armaduras similares às dos soldados agressores. Eram soldados também.

Todos do mesmo exército, agora ficava claro, pelo brasão que traziam no peito e que Astray aterrorizado reconheceu: era o símbolo de Takhisis, a Rainha Dragão, a deusa maligna do poder e da dominação e nêmesis de Paladine. O mesmo símbolo que há cerca de um ano atrás Nerany Kansaldi erguera diante dele. De repente, ainda que inacreditável, tudo fez sentido para Astray: havia um exército, literalmente um exército, de seguidores de Takhisis na região, e Kansaldi fazia parte deles. Se tratava-se apenas de um culto de fanáticos extremamente perigosos e bem armados, ou de algo ainda maior, ele não sabia dizer. Mas o certo é que a sombra da Rainha Dragão, uma sombra esquecida em Krynn desde antes do Cataclisma, agora se projetava mais uma vez ameaçadora sobre a Solamnia.
Uma das criaturas que avançou sobre Martin empunhava duas espadas curtas com uma agilidade impressionante. Seu escudo se partiu para sua surpresa ao ele bloquear uma série de golpes extremamente rápidos e precisos que ainda conseguiram provocar ferimentos superficiais nele. Mas Martin não se intimidou e usou o ataque da criatura contra ele como uma distração contra a outra criatura, a mais robusta, que empunhava uma espada longa. O golpe de Martin foi preciso e mortal, atingindo por entre as escamas e penetrando a pele macia do inimigo com sua espada bem no coração. A criatura soltou um balido agudo e moribundo e esse foi seu último suspiro. Porém, ao invés de simplesmente tombar morto, o inimigo abatido começou a se transformar em pedra diante do olhar surpreso de Martin. Sua espada, ainda no corpo que se petrificava do inimigo, começou a se transformar em pedra também, e a petrificação alcançou seu braço e começava a se espalhar por todo seu corpo, imobilizando-o. Nesse momento a criatura com duas espadas curtas aproveita-se para desferir um golpe traiçoeiro e preciso contra Martin, atingindo-o também mortalmente. Martin cai de joelhos no solo, com seu corpo transformado em pedra.
Até aquele momento a chances da batalha pareciam equilibradas, porém, ao ver Martin cair, o desalento toma subitamente Astray. As forças de Takhisis pareciam prestes a derrotá-los. Porém, para surpresa de todos, do outro lado da estrada, dardos de energia arcana atravessam o ar sibilando perseguindo, como um bando aves de rapina, seu alvo: um dos soldados que estava prestes a golpear Ryushi. Os dardos místicos atingem o soldado de Takhisis estourando a placa de peito de sua armadura, levando seu corpo sem vida violentamente contra o solo. Na curva, do outro lado da estrada, de onde veio a magia, surgem Archimond e Rhimarim. Eles também haviam atendido ao convite do funeral, e já se aproximavam de Vogler quando o barulho do combate lhes atraiu. Mais uma vez o destino unira os aventureiros da Noite do Olho.
Ryushi aproveita a distração, e a morte de seu agressor, para correr na direção do corpo petrificado de Martin. O ferreiro também tinha algum conhecimento na artes da cura, e faria de tudo para salvar seu amigo. Porém, ao chegar onde Martin estava, foi atacado pela criatura que o fizera tombar. Ryushi bloqueia com suas manoplas habilmente a sequência de golpes de espada curta desferido contra si, mas isso o impede de ajudar Martin. No entanto, para a surpresa de todos, Martin se recupera sozinho: o corpo petrificado do jovem guerreiro começa a se mexer movido pela sua pura força de vontade, e logo a fina camada de pedra que o imobilizara se despedaça; o grito de fúria de Martin preenche o ambiente e ele se ergue determinado a trazer a morte a seus inimigos. E assim, mais uma vez, o faz. Um golpe preciso de sua espada longa atinge pesadamente o corpo da criatura que quase o matara, quase partindo-a ao meio. Porém, assim como com o outro ser, sua morte vem acompanhada de um efeito maligno: seu corpo se desfaz numa poça de ácido que espirra e atinge Ryushi e Martin e por pouco não os fere gravemente.
A recuperação milagrosa de Martin é o suficiente para levantar a moral do grupo e fazer a batalha virar a favor dos aventureiros. Em pouco tempo quase todos os inimigos são subjugados. Quase todos, pois, do outro lado, Archimond estava prestes a tombar perante o machado do comandante daquele grupo de soldados, aparentemente um experiente e cruel mercenário que havia se tornado uma espécie de sargento das tropas de Takhisis. Percebendo isso Ryushi faz um cálculo arriscado. Vendo diante de si uma pedra, ele calcula rapidamente o melhor ponto e a força necessária para chutá-la como um projétil, e a pequena pedra atravessa o campo de batalha como se arremessada como uma catapulta, atingindo em cheio a mão do sargento, e arrancando o machado da mão dele. Diante daquilo, percebendo a derrota, o sargento foge, deixando seu machado e um Archimond, embora muito ferido, ainda vivo, para trás.
Após o fim do embate o grupo buscou primeiro cuidar dos feridos. Martin, embora tivesse se erguido sozinho, havia sido seriamente ferido. Seu ferimento ainda sangrava e, por pouco, a lâmina da criatura não trespessara o coração dele. Astray, com os ensinamentos de sua época de monastério, e as bênçãos de Paladine, conseguiu estancar o ferimento e logo Martin começou a se recuperar. Archimond, por sua vez, foi socorrido por Ryushi.
Em seguida o grupo investigou o que restava da pequena caravana atacada. Descobriram que se tratava mesmo de um grupo de 6 Cavaleiros da Solamnia que haviam sido despachados para a região para levar uma série de planos e relatos bem como apoio militar, à cidade de Kalaman. Martin encontrou os referidos documentos e os leu para os outros: os relatos indicavam que aparentemente um misterioso exército se deslocara do leste e agora ameaçava Hinterlund. Sendo Kalaman uma importante cidade da região havia riscos dela ser um alvo sujeito a um cerco. Sem dúvida fora uma grande sorte eles terem chegado a tempo de , ainda que não há tempo de evitar a morte dos Cavaleiros, de evitar que os planos fossem levados.
Astray revistou o corpo do cavaleiro que havia salvado a vida de Ryushi. Os anos como mercenário tornaram esse tipo de tarefa corriqueira para ele, coisa que ele executava com uma naturalidade que o afastava dos outros. No corpo de Markam Vendri ele encontrou uma carta endereçada a sua antiga mentora, a Cavaleira da Solamnia residente de Vogler Becklin Uth Viharin. Astray guardou a carta consigo. Parecia que, mais uma vez, o destino forçava a mão para que ele tivesse enfim uma conversa na há muito postergada com Becklin. Mas o que chamou de fato a atenção de Astray foi o belíssimo Amuleto do Rei Pescador que a mão lívida de Sir Vendri agarrava rigidamente. Quando teve certeza que ninguém mais o observava, Astray guardou rapidamente o amuleto consigo.

Ryushi, por sua vez, decidiu ficar com o machado do sargento para si como um troféu. Parecia um machado comum, velho e usado, embora ainda tivesse fio suficiente para degolar com facilidade um oponente.
Após isso decidiram partir para Vogler imediatamente. Eles afinal precisavam participar de um funeral que provavelmente já havia começado. E aquilo que eles descobriram há poucos instantes apenas tornava a chegada a Vogler ainda mais urgente.
Um Funeral

Ao chegarem às docas de Vogler, após adentrar a cidade pelo Portão do Rio, o funeral já havia começado. Becklin e Cudgel, as maiores e mais antigas amigas de Ispin, faziam as últimas honras. O corpo de Ispin Greenshield seguiu pelo Rio Vingaard sobre um pequeno bote, coberto de flores, frutas e folhas. Um Kingfisher voou pelos céus e sobre o rio daquela manhã de outono quente e de céu azulado, até que pousou no bote, sobre o corpo de Ispin, parecendo bicar uma fruta. Mas Astray Verda sabia que o pássaro havia sido enviado ali para conduzir o espírito de seu grande amigo e guerreiro. Ou pelo menos, assim ele esperava.

Após o funeral todos se reuniram na Brass Crab, para prestar as últimas homenagens e beber em honra de seu antigo proprietário. Naquele último ano, Martin soube conversando com convidados e com sua meia-irmã mais nova Raenna, Ispin havia gastado todas as suas economias tentando descobrir mais sobre o que acontecera com Lyhriann. Ele não havia nunca aceitado a morte da filha mais velha, fundado na vã esperança de que o corpo dela jamais fora encontrado. Contratou batedores e ladinos em busca de informações, sem sucesso. Deprimido, bebeu o restante do dinheiro. Lhe restou, antes de morrer, vender a taverna para uma antiga companheira, Yalma, que agora era a proprietária do Brass Crab.

Yalma foi a primeira a fazer uma eulogia para Ispin. Contou como haviam se conhecido, insinuou – para o desprazer da viúva de Ispin, a madrasta de Martin – acerca do tórrido romance que tiveram no passado, mas que não era para ser. Ainda assim Ispin sempre havia sido um amigo que lhe tratara com todo o respeito e carinho. Diversos outros convidados falaram.

Than, o gnomo inventor, contou como ele e Ispin criaram juntos a curiosa Antler Ale, que, embora deliciosa, tinha o peculiar efeito colateral de, junto com a ressaca, fazer chifres crescerem na cabeça que lá permaneciam por pelo menos três dias. Eltar, outro taverneiro, dono da taverna Fishbowl, situada no mercado de peixes, lembrou da generosidade de Ispin e de como ele o ajudara a de um pescador que vendia sua pesca para o Brass Crab se tornar outro taverneiro na cidade.

Umpton Lanth, o Oficial das Docas, responsável pela coleta de taxas, contou como, de guerreiros rivais em sua juventude, ambos se tornaram companheiros de bebida e vizinhos que se ajudaram muito quando decidiram enfim descansar suas armas e residir na bela e pacata Vogler. E também Ryushi de Neraka declarou como a bondade de Ispin, que lhe recebera como a um filho, o ajudara a chamar de Vogler seu novo lar. Martin não tinha palavras. Ficou sentado em um canto amargurado, bebendo – evitando porém a Antler Ale. Quando cansou de tudo aquilo, e se preparava para sair, foi interceptado por sua madrasta.
A viúva de Ispin jamais tinha aceitado ele, o bastardo, mas naquele momento ela queria lhe falar. Raenna, sua meia-irmã mais nova, o convenceu a acompanhá-las à casa que fora de seu pai, onde ele mesmo, Martin, entrara poucas vezes, pois dada a amargura da viúva de seu pai, a morada do jovem sempre fora o Brass Crab. Por insistência de Raenna, porém, Martin decide deixar suas amarguras de lado e acompanha a meia-irmã e a madrasta. Lá ele recebe a herança que Ispin lhe deixou: o famoso Green Shield que, segundo uma das muitas variantes da história contada pelo taverneiro entre uma cerveja e outra, lhe teria sido presenteado por um unicórnio, ou uma sedutora e poderosa sacerdotisa centauro de Abanisinia que se enamorara dele. Juntamente com ele uma carta, na qual Ispin explicava que sentira muito a falta se Martin naqueles últimos dias, e que tinha certeza que ele seria capaz de honrar o legado daquele escudo muito melhor do que Ispin; e que, acima de tudo, ele sempre fora um garoto do mais bom e puro coração, e que ele jamais deveria se esquecer disso em suas aventuras que viriam.

Em outro lugar, Astray fazia ele próprio as pazes com seu passado. Ou pelo menos tentava. Afinal, havia muito ressentimento e desconfiança entre ele e sua antiga mentora, Becklin Uth Viharin. Ainda assim ele reuniu a coragem necessária para se aproximar da circunspecta Cavaleira da Solamnia e lhe contar sobre o que se passara na estrada, mostrando a carta que estava endereçada a ela. Entendendo a gravidade da situação, Becklin convidou Astray a se retirar do Brass Crab e a acompanhar até o Forte Thornwall, um antigo posto dos Cavaleiros da Solamnia na região onde ela vivia, e onde eles poderiam conversar de forma mais reservada.
Uma vez no forte, após ouvir mais uma vez o relato de Astray verdadeiramente incrédula, ela então abriu a carta e a leu. Diante dos olhos de Astray a imponente Cavaleira assumiu um semblante que ele vira poucas vezes ela assumir: completo terror e desespero. A pele de Becklin imediatamente ficou branca como a neve ao ler o conteúdo da carta que ela, com as mãos trêmulas, deixou cair no chão antes de cambalear para trás evidentemente muito abalada. Astray, diante dessa visão, quase que sem pensar, se abaixou e pegou a carta caída no chão e a leu. A carta era assinada pelo Grão-Mestre da Ordem dos Cavaleiros da Solamnia e saudava Becklin, dizendo ainda que a ordem precisava, mais uma vez, infelizmente recorrer a sua experiência, pois afinal, o maior dos temores dele e de tantos outros, era verdadeiro: a Rosa Negra desabrochara mais uma vez.